ARTIGOS E OUTRAS PUBLICAÇÕES
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| ARTIGO |
Conhecer a fome: saberes situados e a produção da desigualdade
Inicio este ensaio sobre fome anunciando que também dissertarei sobre comida. Escolho esse caminho narrativo porque as compreendo como processos imbricados em nossas práticas de existência (e para muitas, de sobrevivência), ou seja, como centrais às políticas da vida (Fassin, 2012). Embora haja perspectivas que considerem esses objetos enquanto polos opostos, compreendo tanto a comida como a fome como processos políticos corporificados e territorializados. Esse é, portanto, o pressuposto central do presente texto. Isso posto, para falar sobre ambos os fenômenos, o da fome e o da comida penso ser necessário olhar com atenção às práticas cotidianas de existência. Buscando questionar a separação entre o corpo faminto e as relações discursivas de poder que se desenrolam através desses corpos e dos saberes produzidos sobre ele. No conjunto dessa produção de conhecimentos, aspectos de gênero, cor, etnia, raça, deficiência, classe, idade, para mencionarmos as marcas sociais de diferenciação mais mobilizadas, são produzidos e performados.
| ARTIGO |
Pós-pandemia ou a "endemização do (extra)ordinário"?
Uma análise comparativa entre as experiências com a fome, Zika vírus e Covid-19 no Brasil
Passado um ano da “chegada” do novo coronavírus no Brasil, apesar dos números de infecção não apresentarem declínio, iniciou-se um processo de retomada das atividades e adaptação ao “novo normal”. É o objetivo deste artigo mostrar como uma epidemia é construída enquanto uma emergência sanitária, quais os marcadores de sua temporalidade e, principalmente, como ela se produz em um processo de obliteração e externalização de fatores que muitas vezes são inerentes aos seus efeitos. Para tanto, recuperamos a trajetória de duas experiências “epidêmicas” anteriores, vivenciadas em território brasileiro, a fome e o Zika vírus. Mostraremos, a partir dessa comparação, que a epidemia de Covid-19 deve ser entendida levando em consideração que sua trajetória é produzida conjuntamente com outras experiências de saúde e doença. Se os significados do “novo normal” estão sendo disputados, é importante trazer à luz os processos que reproduzem cotidianamente o “normal de novo”.
| ARTIGO |
Is Life only about a virus?
Covid-19 and its impacts on Food Security
How can we think about the guarantee of an adequate standard of living for all human beings if the government is compelling them to leave the safety of their homes? This pandemic is more than just a virus. It motivates us to rethink the opposition between the realm of politics and the realm of the economy. Thus, it is by analyzing access to food that the most material aspect of this dualism can be brought to light. If “human societies are brought to the starvation point by cultural rather than natural forces” (De Castro 1952: 24),this pandemic is providing the means to return to the original meaning of economy—the management of the household. Understanding it as the maintenance of life—an instrument of production and reproduction of the material conditions necessary for a dignified human existence—completely reframes the opposition between the economy and politics. However, if the need for food is not understood as foundational to governance and societal development, the idea of life itself will remain solely associated with its barest form.
Blanco, Lis. Is Life Only about a Virus? COVID-19 and Its Impacts on Food Security. Gastronomica 1 August 2020; 20 (3): 76–77. doi: https://doi.org/10.1525/gfc.2020.20.3.76.
| ARTIGO |
Incorporando relações: aproximações antropológicas sobre comida e risco
O objetivo deste artigo é tratar das relações entre comida e risco, a partir do pressuposto de que a comida carrega com ela, para além de simbolismo, materialidades que são incorporadas, literalmente, através do ato de ingestão. Este texto, além da ambição de contribuir com uma revisão teórica sobre a temática da alimentação na antropologia, pretende propor uma abordagem metodológica sobre comida que vá mais além de sua definição como linguagem, ou como mediador social, compreendendo-a enquanto objeto promulgador de realidade. A maneira que definimos comida definiria não só a materialidade daqueles que a incorporam, mas as próprias relações que estes estabelecem com o mundo, e o risco seria o recorte, pelo qual podemos entender como um objeto é definido como comida, em um contexto que é muita vezes concebido como a antítese da cultura, o contexto da pobreza extrema. Para tanto, articularei a discussão mais atual sobre a “Farinata”, do ex prefeito João Doria Jr., em relação com cenas etnográficas resultado de minha pesquisa de campo, em 2013, na cidade de São Paulo.
Blanco L. F.; (2019). Incorporando relações. Revista Ingesta, 1(1), 101-123. Recuperado de http://www.revistas.usp.br/revistaingesta/article/view/152346
| ARTIGO |
Coisa de Congada: um relato a dez mãos
Chegamos em Aparecida, São Paulo, no dia 22 de abril de 2017. Sabíamos muito pouco, ou quase nada, do encontro de Congadas e da Festa de São Benedito, que já estava em sua 108ª edição. O desafio de realizar uma etnografia conjunta deste evento – com um grupo de antropólogos (e amigos), com afinidades em comum, mas que estudam temas tão diversos como música popular, xamanismo, políticas públicas e catolicismo – foi o que mais nos motivou a encarar tal empreitada (que se revelaria muito mais cansativa do que poderíamos imaginar). Múltiplos olhares, múltiplas perspectivas, nenhum “especialista”.
| ARTIGO |
A comida como direito: apontamentos sobre o direito à alimentação adequada a partir da trajetória do Fome Zero
Na criação do Programa Fome Zero, era pressuposta a ideia do direito à alimentação como parte inalienável dos direitos fundamentais do homem tendo como princípio político a perspectiva de que o acesso à comida não deve transitar no terreno da filantropia. Mais de dez anos se passaram desde o lançamento do Fome Zero, mas a questão do direito à alimentação e sua associação com políticas consideradas assistencialistas ainda é tema de debate.
Neste sentido é objetivo deste artigo, partir da definição e problematização das categorias de comida e alimento para discutir o atual cenário do Direito à Alimentação Adequada no Brasil através da análise de uma cena etnográfica, que se passou no Conselho Municipal de Segurança Alimentar de São Paulo, a qual é parte de minha pesquisa de doutorado sobre a fome enquanto objeto múltiplo. Pretendo assim, compreender, a partir de questionamentos levantados por esta cena etnográfica, algumas categorias imbricadas nesta disputa, tais como a noção de direitos, assistência, vulnerabilidade e bem-estar social em ação/circulação/pauta.
Blanco, Lis Furlani. 'A comida como direito: apontamentos sobre o direito à alimentação adequada a partir da trajetória do Fome Zero'. ALABRASTO, v. 1, p. 13-30, 2018.
| RESENHA |
GRAHAM, Richard. “Alimentar a cidade: das vendedoras de rua à reforma liberal (Salvador, 1780 - 1860)”
Richard Graham inicia seu livro afirmando que “nenhuma cidade alimenta à si mesma (…) Salvador era uma grande cidade nas Américas do século XVIII. Isso nos estimula a investigar não apenas essa malha de relações comercias, mas também o que seu funcionamento revela sobre a composição social da cidade” (p. 19). Tal afirmação se apresenta como o objetivo central da obra aqui resenhada, buscando, segundo o próprio autor, deixar de ver exploradores e explorados, pois “ao desvendar a vida de pessoas dentro de um grande universo de experiências individuais, [o autor] busca detalhes específicos, tentando compreender alguma coisa do contexto em que viviam” (p. 23). É exatamente através da história de certas pessoas que habitavam Salvador entre o século XVIII e XIX que Graham vai construindo sua narrativa. Enquanto historiador, se coloca como preocupado com as categorias que impõe “a pessoas que não necessariamente viam a si mesmas como pertencentes a elas, mas tent[a] não tirar conclusões a priori sobre indivíduos a partir dessas classificações” (p. 23).
Blanco, Lis Furlani. Resenha: GRAHAM, Richard. "Alimentar a cidade: das vendedoras de rua à reforma liberal (Salvador, 1780 - 1860)". PONTO URBE, v. 22, p. 1-6, 2018